Bloco de Notas, Notícias &
Referências acerca do património cavernícola do Concelho de Vila do Bispo, com
especial atenção para as cavidades e abrigos com vestígios arqueológicos de presença humana.
Neste capítulo, em suporte digital, pretende-se dar notícia das acções promovidas no âmbito do projecto de levantamento sistemático, espeleo-arqueológico, de Vila do Bispo, a integrar na sua futura Carta Arqueológica.
Explorando as referências actualmente disponíveis, torna-se obrigatório inaugurar este trabalho pelo incontornável contributo do pioneiro da científica investigação arqueológica algarvia, Sebastião Philippes Martins Estacio da Veiga, designadamente pelo volume I das suas Antiguidades Monumentaes do Algarve: VEIGA, E. da (1886) – Antiguidades Monumentaes do Algarve - Tempos Prehistoricos, vol. I. Lisboa: Imprensa Nacional, p. 33-61.
Nos finais do século XIX, Estacio da Veiga realiza a Carta Archeologica do Algarve, cria o Museu Archeologico do Algarve e publica as suas Antiguidades Monumentaes do Algarve, legando-nos um inestimável acervo de informação arqueológica regional, associado à enumeração de um conjunto de fundamentais pressupostos metodológicos e de orientações científicas para a actividade arqueológica nacional, plenos de actualidade e que ainda hoje deveriam servir de guião para os nossos trabalhos.
Segue-se, assim, uma selecção de passagens do volume I das Antiguidades Monumentaes do Algarve de Estacio da Veiga, genericamente dedicadas à investigação arqueológica em ambientes cársicos e, mais especificamente, às "Cavernas" do Concelho de Vila do Bispo.
VEIGA, E. da (1886) – Antiguidades Monumentaes do Algarve - Tempos Prehistoricos, vol. I. Lisboa: Imprensa Nacional, p. 33-61.
MACHADO, A. de B. e
MACHADO, B. de B. (1945) – Inventário das Cavernas Calcárias de Portugal. Separata
de O Instituto, vol. 105. Coimbra.
Distrito de FARO, Concelho de Vila-do-Bispo (p. 21)
Freg. Budens:
(96) Gr., perto da povoação.
Freg. Sagres:
(97) Fojos da Ponta de Sagres, no extremo da Ponta de Sagres, à esquerda do posto semafórico, O [CORTESÃO, Jaime (1927) – Sagres. In Guia de Portugal. PROENÇA, vol. 2, p. 314].
(98) Furna do Beliche-Velho, na costa maritime, entre a fortaleza de Beliche e a ponta de Sagres [VEIGA, E. da (1886) – Antiguidades Monumentaes do Algarve - Tempos Prehistoricos, vol. I. Lisboa: Imprensa Nacional, p.61].
(99) Furna de João-Vaz, «sôbre o flanco esq. da enseada defendida pela Fortaleza da Balieira e a margem direita da ribeira de Benaçoitão» [VEIGA, E. da (1886) – Antiguidades Monumentaes do Algarve - Tempos Prehistoricos, vol. I. Lisboa: Imprensa Nacional, p.61].
Freg. Vila-do-Bispo:
? (100) Gr. dos Ouriçais, «junto à praia da Roiçada ou do Telheiro, 1 km a NO da ponta do cabo e outro a S do Leixão de S. Vicente sôbre a costa ocidental» [VEIGA, E. da (1886) – Antiguidades Monumentaes do Algarve - Tempos Prehistoricos, vol. I. Lisboa: Imprensa Nacional, p.60].
? (101) Cav. da Barriga, a NE e distante da ponta do Cabo de S. Vicente uns 5 km e uns 6 para O.SO de Vila-do-Bispo [PROENÇA, R. (1924) – Guia de Portugal, vol. 1, LXIV, Lisboa: Biblioteca Nacional, p.319] [VEIGA, E. da (1886) – Antiguidades Monumentaes do Algarve - Tempos Prehistoricos, vol. I. Lisboa: Imprensa Nacional, p.319].
Neste capítulo, em suporte digital, pretende-se dar notícia das acções promovidas no âmbito do projecto de levantamento sistemático, espeleo-arqueológico, de Vila do Bispo, a integrar na sua futura Carta Arqueológica.
Explorando as referências actualmente disponíveis, torna-se obrigatório inaugurar este trabalho pelo incontornável contributo do pioneiro da científica investigação arqueológica algarvia, Sebastião Philippes Martins Estacio da Veiga, designadamente pelo volume I das suas Antiguidades Monumentaes do Algarve: VEIGA, E. da (1886) – Antiguidades Monumentaes do Algarve - Tempos Prehistoricos, vol. I. Lisboa: Imprensa Nacional, p. 33-61.
Nos finais do século XIX, Estacio da Veiga realiza a Carta Archeologica do Algarve, cria o Museu Archeologico do Algarve e publica as suas Antiguidades Monumentaes do Algarve, legando-nos um inestimável acervo de informação arqueológica regional, associado à enumeração de um conjunto de fundamentais pressupostos metodológicos e de orientações científicas para a actividade arqueológica nacional, plenos de actualidade e que ainda hoje deveriam servir de guião para os nossos trabalhos.
Segue-se, assim, uma selecção de passagens do volume I das Antiguidades Monumentaes do Algarve de Estacio da Veiga, genericamente dedicadas à investigação arqueológica em ambientes cársicos e, mais especificamente, às "Cavernas" do Concelho de Vila do Bispo.
VEIGA, E. da (1886) – Antiguidades Monumentaes do Algarve - Tempos Prehistoricos, vol. I. Lisboa: Imprensa Nacional, p. 33-61.
Cavernas (Vol. I p.
33-40; 49-54)
«Sob
a denominação de caverna
correm confundidos vários termos
de equivalente significação, taes
como fuma,
algar, gruta
e lapa, que todavia poderiam
ser estremados com restricção
especial, tendo-se em
apurada conta o
sentido, mais popular que
litterario, com que a
gente campesina emprega cada
um d’esses vocabulos.
Pela designação de
furnas são assás conhecidas
no Algarve as cavernas da costa
maritima, ao passo que
na região sertaneja ou serrana se
denominam algares,
sobretudo se as suas
entradas
são abertas na rocha
á feição de poço,
se dão entrada ás torrentes
pluviaes e medem grande
profundidade.
Não é tão
nomeada a
gruta como o
são a furna
e o algar,
e comtudo os habitantes
do campo sabem distinguil-a,
applicando o termo
a certas cavidades
de limitadas dimensões, que podem
ser utilisadas para abrigo de gados
e pastores.
De todas as
mencionadas palavras a
menos vulgar é
a lapa,
que mais geralmente se
refere, não tanto a
covas e nichos que
se acham em rampas
de montes e n’outros
logares, como a grandes
chapas de rochas estratificadas,
que se destacam das
pedreiras ou
se encontram isoladas e
dispersas.
Cabe n’este logar,
embora como simples curiosidade,
que o viajante póde admirar
no tracto da raia
maritima, comprehendido
entre a ponta de Sagres e
a occidental de Albufeira, a
noticia de
umas formações, de todo
o ponto singulares, devidas
á acção erosiva das
aguas e a outras causas
ou agentes naturaes, a
que promiscuamente se dão
os nomes de fôjos,
pégos e abysmos,
sendo este talvez o
mais apropriado, se ao
mesmo tempo se
lhe juntar o de precipicios,
como de feito o
são para os incautos
e desprevenidos, que
percorrem os logares em
que existem uns tão
pavorosos phenomenos da
natureza.
No curso de
geologia, regido na
escola polytechnica de
Lisboa pelo sabio decano
d’aquelle illustradissimo professorado,
o sr. conselheiro
dr. F. A. Pereira
da Costa, abalisado mestre
dos geologos portuguezes, a quem
as sciencias physicas e
naturaes, e a
archeologia prehistorica devem
serviços do mais elevado
alcance, que em
tempo algum, sejam quaes
houverem de ser os
progressos d’essas sciencias n’este
paiz, poderão ficar em
deslembrança, consta-me
haver o mencionado sabio lente
de mineralogia
e geologia, antigo director d’aquella escola e
meu também antigo
e sempre respeitavel
mestre, feito referencia
a essas construcções naturaes
da costa maritima do
Algarve, dando-lhes
porém a denominação
especial de marmitas de
gigantes. Nunca
assisti ás prelecções em
que o sapiente professor se
tem occupado d’este
assumpto e por isso
não estranharão os seus
modernos discipulos,
se alguma vez honrarem os
meus escriptos com
a sua leritura, de
não o acharem aqui
tratado com tanta proficiencia
e lucidez como lhes
foi ensinado, ficando advertidos
de que o meu
principal intuito se
limita simplesmente a registrar,
no genero caverna,
a marmita de gigantes, a que
mais vulgarmente, como disse,
ouvi dar a denominação
de fôjo,
pégo, ou abysmo,
mas que
n’um documento official tem
ainda outro nome.
As denominações
de marmita de
gigantes, de caldeira,
ou pot-holes
dos inglezes, applica Beudant,
no seu curso elementar
de geologia, sob a
epigraphe, Effects des
chutes d’eau, não tanto
ás cavidades que no leito
das ribeiras, e mui provavelmente
no de mares pouco
fundos, são produzidas pelo
redemoinho das aguas
que dão movimento giratório
ás areias e calhaus que
as torrentes arrastam,
e a que se
dá geralmente o nome de turbilhões
ou de sorvedouros,
porém mais especialmente
áquellas cavidades
que se acham em terrenos
elevados, e já fóra da
acção de qualquer
quéda de agua; e
com este fundamento,
talvez, applicou
o sr. dr. Pereira
da Gosta a denominação de
marmitas de gigantes
ás enormes caldeiras
da praia elevada do
Algarve já constituidas,
e para dar melhor idéa
da causa que as
produziu, incluiria no
grupo geral as que
ainda estão em
via de formação.
Uma diversa nomenclatura,
hoje esquecida, ou antes desconhecida, foi
imposta a essas caprichosas
construcções naturaes no fim do
seculo passado, quando
o benemerito conde de
Valle de Reis,
Nuno José Fulgencio
de Mendoça e Moura, sendo
governador e
capitão general do
Algarve, mandou levantar a
planta das fortificações de
todo o litoral maritimo pelo
tenente coronel José de Sande
e Vasconcellos. Este engenheiro, no
seu trabalho inedito, intitulado
Mappa da configuração
de todas as praças, fortalezas e
baterias do reino do
Algarve
representa a rocha de
Sagres para poder figurar
a fortaleza, a praça,
e a bateria, que
existe na extremidade
propinqua ao oceano, e
n’esta planta marca
os logares em que ha dois
d’esses famosos abysmos, dizendo
n’uma nota: «Bôcas de
dois hydrophilacios,
que são uns vacuos
subterrâneos cheios de
agua que respiram para a
superficie da terra».
A planta de
Sagres não tem escala
e por isso não
posso designar as distancias
em que estão os hydrophilacios
relativamente á bateria
da ponta de Sagres, de
que mais se approximam do
que das muralhas da praça.
Na celebre obra
do sr. Major, Vida
do infante D. Henrique, traduzida do
inglez pelo sr. José
António Ferreira Brandão,
e mandada publicar
em 1876
pelo sr. duque de
Palmella, meu
antigo condiscipulo no
primeiro e segundo
anno de mathematica na
escola polytechnica, vem uma planta
da peninsula de Sagres
(pag. 107), em que
é figurado a um
quarto de milha ingleza
para o sul um
d’esses pavorosos abysmos. Devo. porém, advertir
o viajante que visitar aquelles
logares, que o primeiro
hydrophilacio ou abysmo, seguindo-se
da praça para a bateria, acha-se á esquerda,
um tanto ao
nascente, e o segundo
muito mais perto da
bateria no lado
opposto, e por isso
póde passar entre elles
e observal-os com prudente
cautela, quando não
prefira levar um
guia, que o encaminhe
por aquelle admiravel isthmo,
que as embravecidas
ondas do oceano, em
dias procellosos, parece quererem
subverter, não obstante estar
sobre o nivel das
aguas em altura de
39 metros, como indicando
o unico ponto do
mundo que o brio
nacional deve preferir a
quantos hão sido
indicados para ser honrado
e honrar-se com uma
estatua de bronze levantada
em memoria do preclarissimo
infante de Portugal.
Os hydrophilacios
ou marmitas de gigantes occupam na
secção marginal e
propinqua ao oceano, entre
Sagres e Albufeira,
varios pontos da
praia elevada, em que imperam
as formações do
jurassico superior, do terciario
marino e lacustre e
do cretaceo inferior.
A sua configuração geral
é approximadamente a
de um poço
de larguissimo diametro com
abertura irregular na
base, mais ou menos
ampla, em communicação
com o mar,
variando a sua
profundidade, ou altura do
eixo vertical, na razão
directa da cota
de nivel do solo
superficial com referencia á das
aguas salgadas.
Quando nas rochas,
de que se compõem
as praias alias, ha
fracturas naturaes ou
accidentaes, provenientes de
retracções, de violentos
abalos da terra ou
de outras causas, em
contacto com o
mar, bastam estas duas
simultâneas circumstancias para se
operar a formação dos
abysmos ou
marmitas de gigantes.
As ondas,
arremessando-se com impetuosa violencia,
invadem o ambito
d’essas anfractas fendas, produzindo na
sua ascensão um violento
attrito, que necessariamente
promove o alargamento
gradual do
espaço em que é
exercido. Não é porém
a força impulsiva
que recebem as aguas
invasoras o poderoso agente
do alargamento
e muito menos ainda
da configuração proximamente
circular, que manifestam esses
amplos precipicios em
cujo fundo o
incessante embate das
ondas produz pavorosos
estrondos, similhantes
a fortes detonações.
Dada pois a
simultaneidade das preditas
circumstancias n’um determinado
logar, se a ascensão
da massa liquida, que
invade as fendas das
rochas até acima da
superficie do solo fracturado,
é a causa que
origina essas tão singulares formações,
a sua quéda, obedecendo ás
immutaveis leis da
attracção universal, descobertas
por Newton e sanccionadas
por Cavendish, as desenvolve
e acaba, porque essa
quéda é determinada
pela gravidade
inherente a todos os corpos terrestres,
ou força que incessantemente
os attrahe para o centro
da terra, sendo
n’este caso os seus
principaes elementos – a
densidade do
corpo liquido que se elevou
e a reacção da sua
velocidade adquirida
– regidos pela força centrifuga no
seu descente movimento accelerado,
da qual resulta uma
poderosa acção erosiva
de rotação contra as paredes das
fendas e consequentemente
a configuração de taes
formações.
Em
resumo, póde-se portanto
dizer, que o continuo
trabalho das ondas, determinado
por leis e forças
naturaes em todos os
seus movimentos, invadindo as
fendas das rochas fracturadas,
propinquas ao oceano, é
a causa que produz os
abysmos
denominados hydrophilacios ou marmitas de
gigantes.
No caminho que
vae do apparatoso cabo Carvoeiro,
massa compacta de
cretaceo inferior, para
a ermida e bateria
da Senhora da
Rocha, construida sobre uma
extensa formação de terciário
lacustre superior, existe um
d’esses abysmos, assaz
profundo, cujo diametro não
medirá menos de
30 metros, e como
este se encontram outros
muitos no rumo de
poente até á ponta
de Sagres, como ficou
dito. Convem pois não transitar
por esses logares,
em que de repente o
incauto viajante póde
achar-se á beira
de um precipicio,
sem levar um guia
que o saiba encaminhar
com a precisa segurança.
Alguns d’esses abysmos
podem ser
visitados pela
praia sem grande difficuldade
na hora de baixamar,
e não soprando ventos
rijos dos quadrantes do sul;
mas escusado seria
quererem-se procurar vestigios
de aproveitamento humano
n’esse genero de
cavernas, que a natureza
parece ter formado
para caprichoso respiradouro das
tempestades do mar.
O estudo scientifico
das cavernas occupa ha
muitos annos a actividade
intellectual dos sabios mais
dedicados ás sciencias naturaes,
á historia da humanidade
e da industria
prehistorica, podendo
dizer-se que os resultados
d’este estudo, tão complexo
e variado pelas
suas intimas e mutuas dependencias,
vieram vincular
em nossos dias uma
serie de affirmações
importantissimas, que as
gerações precedentes não poderam congregar.
Desde antigos tempos
correm vagas noticias e
tradições relativamente ás
cavernas e não poucas
se encontram dispersas em
obras de escriptores classicos, gregos
e latinos. Varios geographos, historiadores
e poetas da antiguidade
fallaram por vezes d’esses
mysteriosos edifícios, que
a natureza construiu e
escondeu no amago
da terra; ficou porém como reservado
para o presente seculo
o reconhecimento geologico, paleontologico
e archeologico, destinado á
comprovação das epochas e
das condições de jazida
em que n’esses
reconditos depositos se hão
manifestado ossos humanos,
ou productos da industria do
homem, associados aos despojos dos grandes
mammiferos extinctos, ás
ossadas de alguns
ainda viventes, mas emigrados em
regiões glaciaes desde as
modificantes evoluções por que
passou a crusta do
globo após o
periodo post-plioceno, e
finalmente ás espécies da
fauna actual;
o que veiu logo mostrar
que as raças humanas,
desde as suas mais
remotas manifestações, utilisaram
as cavernas.
Póde, pois, affirmar-se,
que ás cavernas devem
poderosos subsidios de
elucidação a geologia, a
paleontologia e a archeologia
prehistorica. Se não fôssem
as suas tão significativas
revelações, a sciencia não
teria attingido os complexos
desenvolvimentos que
actualmente a constituem, ou antes
a estão preparando para
ainda emprehender novas
soluções sobre muitos assumptos
em discussão.
Em todas as
regiões da terra ha
cavernas naturaes, devidas
a diversas causas, que promoveram e
promovem a sua
formação e desenvolvimento,
bem como uma multiplicidade
de modificações em harmonia com as
oscillações e movimentos
que os agentes
dynamicos ou forças motrizes
e as acções chimicas
continuamente exercem
no interior da crusta, composta
de muitos e diversos
elementos.
Até ha poucos
annos julgou-se que
as cavernas sómente se
podiam formar nas montanhas
jurassicas, porque n’essas
rochas são mais
frequentes, com effeito, as
grandes cavidades, deslocações,
abatimentos locaes e
fracturas mais ou menos
consideraveis, como resultado da
natureza especial d’essa formação,
das acções plutonicas,
da retracção e exsicação
dos stractos e da erosão;
mas a observação tem
verificado a sua existência
nas series sedimentares,
principalmente na mesozoica e
cainozoica, comquanto
nas regiões propriamente
calcareas sejam mais vastas
e muito mais
abundantes.
É o facto
que tambem se verifica no
Algarve e se mostra, posto
que em minguada escala,
com a indicação, feita
na carta prehistorica,
de algumas cavernas mais
conhecidas n’esta zona
geographica.
Não será mui
difficil ao leitor instruido
reconhecer a natureza dos terrenos em
que vão marcadas as
cavernas a que me refiro,
tendo á vista a carta geológica
do reino e reduzindo
á sua escala
de 1:500:000
a do Algarve, que
está approximadamente na
proporção de l:200:000.
D’este modo se observará,
pois, que algumas cavernas
do litoral maritimo estão
abertas em rochas diversas
d’aquellas em que se
acham as da região
central, e que, exceptuando
as rochas eruptivas,
e a maioria (talvez a
totalidade) das da serie
paleozoica, nas outras
duas series sedimentares
ha mais ou menos
cavernas e grutas. Faça-se
um estudo especial n’este
sentido, que as
confirmações não tardarão
(...).»
«Fica
pois em aberto na
prehistoria do Algarve esta
lamentosa lacuna, que impede talvez
desde já uma serie
de importantes conclusões;
mas não podercá
agora, nem em tempo
algum ser lançada á
conta da minha ignorancia,
porque empenhei todo
o meu esforço para que
o estudo das antiguidades
d’esta província
começasse pela exploração das
cavernas.
Em Portugal pouco
relativamente se tem feito,
comquanto sejam dignos
de grandissimo louvor os
trabalhos do sr. Joaquim
Filippe Nery Delgado nas
grutas de Cesareda e
os que foram mandados fazer
em varias cavernas por
Carlos Ribeiro, a
quem
este paiz e a
sciencia ficaram devendo
serviços do mais transcendente
valor, para que o
seu nome em todos
os tempos futuros
mereça gratissima recordação, e
a sua perda, n’uma
conjunctura em que
muito se devêra esperar
de seu genio tão
laborioso, seja justamente sentida
e por emquanto irreparavel.
São excellentes,
abundantes de revelações importantissimas, e altamente
valiosos os trabalhos, concernentes
a grutas e cavernas,
do sr. Nery
Delgado e de Carlos
Ribeiro; mas esses
trabalhos são essencialmente monographicos,
e comquanto forneçam
elementos de grande alcance, consignem
asserções e conceitos
de utilissimo aproveitamento, não
podem pela sua indole,
especialmente local, manifestar
a feição geologica, paleontologica
e archeologica que
a sciencia reclama e
exige ao territorio d’esta
nação.
Marcadas na carta
geographica do reino as grutas e
cavernas exploradas e
estudadas pelos mencionados geologos,
perceberse-ha immediatamente que
esse limitado numero de
pontos isolados
representa apenas a
gloriosa inauguração de um
novo estudo em
Portugal, coroada do mais
feliz exito e merecidamente
estimada, sem que comtudo
permitta ainda as
conclusões, que sómente
poderiam deduzir-se de um
estudo geral, rigorosamente
geographico e systematico
em todo o território nacional.
Falta o nexo
ethnographico para ligar esses
pontos estudados com
as numerosissimas cavernas
não estudadas que occupam
uma grandiosa parcella do
nosso chão continental; falta
o conhecimento geral das
faunas que se deixaram
representadas n’esses
obscuros receptaculos; falta
o conhecimento das raças
humanas que povoaram
ou frequentaram esses reconditos
abrigos; faltam as
manifestações directas dos
typicos productos da industria de
cada uma d’essas raças; falta
o conhecimento dos pontos
que ligaram as
estações troglodyticas d’este
solo com os
dos territórios adjacentes,
ignorando-se portanto o
trajecto da marcha, se
a houve, que seguiram em
cada periodo os povos
que habitaram as cavernas;
e admittindo-se que
a peninsula não tivesse
tido aptidões de geração biologica
propriamente suas, e
só se povoasse
com gente de estranhas plagas,
falta o reconhecimento
do hypothetico ponto de partida
d’essa gente ao
entrar n’este território
e o da sua ultima estação,
assim como de não
estar ainda feito
este apuramento, a que
se devera chegar, falta
tambem uma
serie de outras
importantes noticias para, á
luz da critica dos
factos, se poder interpretar
e reconstruir cada uma
d’essas remotissimas
civilisações e escrever-se a
sua historia, começando-se pelos
primeiros assomos da existencia humana n’esta derradeira
faxa occidental da terra.
Assim como a
geologia, no estado de
progresso a que já hoje tem
chegado, póde afoutamente
determinar as evoluções cósmicas
e os cataclysmos
por que passou esta parte
do continente europeu,
enumerando as phases de sublevação
e o de abaixamento
até á fixação do
actual relevo orographico pelo simples exame
das suas rochas
sedimentares plutonicas e
metamorphicas, pela composição mineralogica
e direcção que ficaram tendo as montanhas e
os valles, incluindo o curso dos rios e
ribeiras, do mesmo modo
a paleontologia poderia
já determinar as faunas
que povoaram este
solo, pela maior parte
primitivamente inundado; a
anthropologia ou paleontologia
humana poderia já
apontar as raças que viveram n’esta
região, e foram ainda
testemunhas impassiveis
das grandes perturbações
que parcialmente modificaram o
relevo e configuração
da crusta terrestre após
o período post-plioceno,
por isso que, a
admittirem-se como comprovações
indirectas da existencia
humana os productos da
sua industria encontrados
por Carlos Ribeiro nos
valles do Tejo e
do Sado, já n’este
territorio havia homens
na epocha terciaria, como
tambem os havia
n’outras regiões do globo; e
finalmente a archeologia prehistorica
chegaria a inventariar chronologicamente, permitta-se-me a impropriedade
do termo, as provas da
industria dos homens, as
phases de desenvolvimento
e perfeição relativa por que
foram passando de
umas para outras civilisações,
incluindo o modo de
viver e de sentir
de cada uma, deduzindo-se
d’essas mesmas
provas e das condições
dos seus jazigos.
Está tudo isto por
fazer e por saber,
porque faltam estudos fundamentaes,
que só podem ser emprehendidos, mediante um
plano rigorosamente systematico, por
uma sociedade cientifica
expressamente organisada para este fim
especial, já que as existentes
no nosso paiz parecem
ter-se totalmente esquecido da sua
propria indole e da obrigação
social, que se arrogaram,
de levarem a cultura
e o progresso das
sciencias até o seu
maximo desenvolvimento!
Era ás academias
e sociedades altamente
scientificas do reino que
competia a iniciativa,
o primeiro brado, o
primeiro esforço n’este
sentido, para assim se
desempenharem da responsabilidade
que contrahiram com o paiz,
com a
sua propria dignidade e
com
o futuro, cumprindo aos
governos sabios, illustrados e
patrioticos, o concurso
dos seus mais efficazes e
poderosos auxilios, como
se tem feito
na França, na Belgica,
na Allemanha, na Inglaterra,
e mesmo n’outras
nações de menor vulto,
mas que
prezam a sciencia
e o pundonor nacional.
Nada d’isto se
tinha emprehendido até
1877, quando a
voz publica convidou o
governo a mandar estudar
umas antiguidades que fortuitamente
haviam ficado á
vista na margem direita do
rio Guadiana e
em varios pontos do Algarve.
Fui eu incumbido d’este
estudo, sem que para
isso me fizesse lembrado,
e pedi logo tres mezes
de espera para organisar
o plano geral dos
trabalhos que havia
elaborado.
Entendi então, como
entendo hoje, que
em Portugal, embora houvesse
varios especialistas em diversos
ramos da archeologia
monumental, nenhum tinha
ainda manifestado o minimo plano
para levar o paiz
a confraternisar com
as nações que maiores
provas estavam dando do
seu progresso n’esta sciencia.
Apenas tinha apparecido
um geologo audacioso, mas
convicto da significação
dos seus descobrimentos, que, atravessando a
Europa, fôra proclamar n’um
congresso de sabios a comprovação
do homem terciario no
territorio portuguez, e
era Carlos Ribeiro
o athleta que se
atrevêra a affrontar essa
lucta, ainda hoje
não vencida, mas altamente gloriosa,
como a seu tempo se
reconhecerá.
Em archeologia
historica tinha apparecido Emilio
Hübner, um dos
mais abalisados epigraphistas da
Allemanha e professor
da universidade de Berlim, colligindo
e publicando a riqueza epigraphica
que ainda existia em
Portugal, depurando-a das
incorrecções com
que o visconde de
Paiva Manso havia compilado
e publicado
as nossas inscripções romanas.
O sábio dr.
Pereira da Costa publicava
pouco depois as suas preciosas
memorias ácêrca dos
kjoekkenmoeddings
de Cabeço de
Arruda e das antas de
Portugal. Nery Delgado abria
o caminho para
o estudo das cavernas, publicando
a sua famosa memoria
ácêrca das grutas de
Cesareda, seguindo logo Carlos
Ribeiro com o
estudo de outras cavernas.
Começava pois a
haver um certo movimento,
uma certa excitação
no animo d’esses benemeritos
da sciencia, a quem
este paiz sem
duvida alguma deve
relevantissimos serviços; mas
plano geral para
o estudo das antiguidades
do reino, tanto
prehistoricas como historicas,
não tinha apparecido,
como disse, até 1877.
Estando pois encarregado
officialmente do estudo geral
das antiguidades do Algarve
para poder represental-as na
carta archeologica,
que tinha começado a
esboçar em outubro de 1865,
entendi ser aquella a
occasião de poder lançar as
bases definitivas
para o reconhecimento methodico das antiguidades
do reino.
A carta archeologica
do Algarve devia portanto symbolisar todas as
antiguidades que se podessem
verificar n’esta provincia,
sendo a sua representação
subordinada a uma ordem
regular e methodica,
por isso que tinham
de ser descriptas, segundo essa
ordem indispensavel.
Procurar onde deveriam
achar-se as mais antigas
manifestações de
occupação territorial e seguir
pelas subsequentes até, pelo
menos, á data da
conquista portugueza, seria o
plano mais
completo de averiguação,
e conseguidos estes
resultados, ficaria estabelecido
o systema para o estudo e
representação das antiguidades
geraes.
Foi o que
pretendi levar a
effeito.
Comecei por indagar
se nos estudos geologicos
feitos no Algarve se
tinham encontrado provas
directas ou indirectas das
civilisações que
em tempos remotos senhorearam
este território, e
não tendo ficado noticia
alguma a este respeito,
concebi logo o pensamento
de procurar essas provas
geologica e archeologicamente
no amago das cavernas
naturaes d’esta região. Formulei
n’este sentido a
minha proposta; propuz
que fôssem primeiro que
tudo exploradas as cavernas; mas
o governo, temendo a
demora e os
dispendios que poderiam custar
aqui trabalhos identicos aos
que tinham sido feitos
na Belgica por Schmerling
e Dupont, rejeitou-
a, limitando o seu
encargo ao exame das
antiguidades indicadas no
solo por vestigios apparentes.
O exame das
antiguidades do Algarve soffreu
assim um profundo
córte fundamental.
Cumpri portanto as
ordens do governo, não
explorando as cavernas, mas tomei nota
dos pontos em que existiam
as principaes para
simplesmente as indicar a futuros
exploradores. É uma lacuna
que fica em aberto,
sem que nunca possa
ser-me apontada como censura.
Ha muitas mais
cavernas, muitissimas, que não me
seria difficil descobrir
e indicar, se podesse fazer
d’este assumpto um
exame especial sem
a intervenção do governo, a quem
nunca mais acceitarei
commissão alguma de
serviço publico subordinada
aos prasos, de todo o
ponto viciosos e
absurdos, com que um
chefe de repartição calcula o tempo
material que deve levar
uma qualquer exploração
scientifica, parecendo não
formar a mínima
idéa d’este genero de
trabalhos!
Advertirei finalmente, que
estes estudos não
soffrem as restricções ineptas
dos prasos, que podem
todavia ser muito úteis
para certas empreitadas
de trabalhos de artes e officios,
mas que
são incompativeis com aquelles que
nenhum fundamento ministram
ao calculo da zelosa
burocracia. Melhor será,
pois, quando o governo
queira mostrar-se altamente interessado pelo estudo
dos monumentos nacionaes, determinar
uma verba annual para
se dispender com esse
estudo, e mandal-a
competentemente fiscalisar, porque
d’este modo se conseguirá
o resultado, fazendo-se
os trabalhos em devida regra.
Extincta a verba, o explorador
deixa o campo preparado
para continuar no anno seguinte,
se tanto for
preciso, e recolhe-se para estudar
e descrever o fructo
dos seus descobrimentos. Póde
ser que este alvitre
manifeste alguns
inconvenientes; mas, pelo menos,
é racional e toleravel.
Eis-aqui a distribuição
geographica das poucas cavernas
de que tomei nota e
indiquei na carta prehistorica.»
Cavernas do
Concelho de Vila do Bispo (Vol. I p. 58)
Caverna ou Furna da Barriga (Vol. I p. 58-60)
«Está esta caverna, a que dão o nome de furna, situada
a nordeste e distante da ponta do Cabo de S. Vicente uns 5 kilometros. É
accessivel a sua entrada tanto pela praia da costa occidental, como pelo lado
da terra, e não pouco é frequentada por caçadores dos pombos bravos que n’ella
se abrigam. Servindo-me dos apontamentos que devo ao meu obsequioso patricio e
amigo o sr. coronel Francisco Corrêa Leotte, a caverna da Barriga passa por ser
uma das mais vastas de todo o litoral maritimo. Referem homens antigos da Villa
do Bispo, que um estrangeiro, visitando-a, e querendo medil-a, deixára amarrada
á entrada a ponta de uma corda muito comprida e que segurando-se á outra ponta
a desenrolou inteiramente sem conseguir chegar ao fim; o que não parece inverosimil,
se com effeito é certo haver um manuscripto inedito do bispo Jeronymo Osorio,
como se diz, affirmando ter esta immensa caverna 1 legua de extensão. O sr.
Corrêa Leotte afirma não ter podido visitar toda a caverna, porque a curta
distancia da entrada achou a passagem obstruida por um dilatado pégo, produzido
pela corrente das aguas.
Deve notar-se a
circumstancia de estar apenas 2 kilometros distante para nordeste o sitio do
Catalão, onde se tem achado muitos machados de pedra polida em trabalhos
ruraes. Um d’eles foi alli mesmo por mim comprado a um camponez e é o que represento
sob n.º 2, na estampa II. Fica tambem esta caverna distante pouco mais de 6
kilometros para oes-sudoeste da Villa do Bispo, onde se tem achado muitos
machados de pedra, além dos que alli comprei a gente do povo para a minha
collecção, um dos quaes vae figurado com o n.º
1, na mesma estampa II. Logo a 1
kilometro para es-sueste da villa, está o sitio dos Sellanitos próximo á
corrente da ribeira de Benaçoitão, em que igualmente comprei o machado de pedra
n.º 4, da estampa II, e me informaram terem sido encontrados outros muitos.
Dos Sellanitos passando ao norte do Barranco das Hortas e atravessando a
ribeira da Zorreta, outros machados de pedra me foram oferecidos por Joaquim
Leal, achados em Budens, Areias e Curraes, que n’esta ordem represento com os n.º 1, 2 e 3, na estampa III, assim
como na estampa IV, sob n.º 1, mostro um instrumento de pedra
polida, pontagudo n’uma extremidade, que comprei no Serro do Haver, quasi
marginal ao rio de Almádena, mui similhante a outros tres da Torre dos Frades,
que me offereceu António Marcellino Madeira.
Ora, quem tiver á vista
a carta prehistorica, e observar a serie dos pontos designados entre a caverna
da Barriga e o Serro do Haver, notará que toda esta secção topographica está
assignalada ethnographicamente por caracteristicos attinentes a um povo que a
senhoreou no periodo da ultima idade da pedra, ao qual seria difficil attribuir
outro abrigo de habitação que não fôssem as mais proximas cavernas, como podem
ter sido, além das que ficam por apontar, as tres seguintes, marcadas na carta,
isto é, a dos Ouriçaes, a de Beliche Velho e a de João Vaz; e por isso bem
comprehensivel é, quanto seria interessante e presumptivamente promettedora a
exploração que se emprehendesse n’esses reconditos edificios da natureza.
Estas circumstancias de
congruencia, suggeridas á observação e á hermeneutica, vão porém escapando-se
pela tangente das conveniencias materiaes e, a titulo de economia publica,
sendo desprezadas por quem não entende o seu alcance ou não duvida sacrifical-o
em troca de uma verba de despeza, que o simples bom senso reconheceria ser
indispensavel applicar-se em beneficio de um estudo que tem principalmente de
ser baseado na critica dos factos. Não se percam porém de vista as outras tres
cavernas, além das que omitto, que vão marcadas entre o cabo de S. Vicente e a
enseada de Sagres, se alguma vez houver quem as saiba procurar e explorar.»
Gruta ou Furna dos Ouriçaes – Praia do Telheiro ou da
Roiçada (Vol. I p. 60)
«Está situada junto á praia da Roiçada, a que também
chamam do Telheiro, 1 kilometro a noroeste da ponta do cabo e outro ao sul do
Leixão de S. Vicente, sobre a costa occidental. Não tenho noticias especiaes
d’esta gruta. Diz-se ser assás espaçosa, frequentada por bandadas de pombos
bravos, por lontras e rapozas, cujas pégadas, coprolithes, e ossadas alguns
caçadores têem observado. Como não me foi permitido o estudo das cavernas,
deixei de visitar esta gruta ou furna dos Ouriçaes, quando fui investigar se
ainda n’aquelle extremo retalho de terra firme haveria vestigio d’aquellas
mysteriosas pedras Lapides multis in
locis ternos aut quaternos impositos, a que se refere Strabão, e que não
obstante o sentido em que o geographo grego as toma, são interpretadas como
significando antigos dolmens pelo barão de Bonstetten, e se a minha rapida
passagem pela região do cabo de S. Vicente não me permitiu atinar com vestigios
de construcções megalithicas, de tumuli
ou galerias cobertas, como julgo deverem existir, achei comtudo quem me
vendesse um pequeno machado de pedra polida, que represento com o n.º 3, na estampa II, encontrado nas escarpas da rocha proxima ao acastellado
convento de S. Vicente, e me informasse de terem apparecido outros muitos n’aquenas
paragens; o que bem deixa entender que a população neolithica frequentou
aquelles logares, onde de outras habitações, além das cavernas, não ha
vestigios.
Não se me tome porém
tanto á risca ou como prova de affirmação este conceito, para se dar como
averiguado ou como concludente o facto da habitação da gruta dos Ouriçaes,
porque lá estão outras não indicadas na carta prehistorica, que poderiam ter
sido preferidas. Citarei a seguinte.»
Furna ou Caverna do Beliche Velho (Vol. I p. 61)
«Está situada na costa maritima, comprehendida entre o
cabo e a ponta de Sagres, e mais restrictamente entre a fortaleza de Beliche e
a ponta de Sagres. Diz-se ser grandiosa, mas não encontrei quem me désse
approximada idéa das suas dimensões, configuração, e das particularidades
apparentes que possam recommendal-a a um estudo especial, além da circumstancia
de se achar n’uma zona de terra em que têem apparecido instrumentos de pedra e
a que o testemunho histórico de Strabão, bem como as tradições propagadas por
Artemidoro, contemporâneo de Julio Cesar, attribuem uma remota habitação.»
Furna de João Vaz – Baleeira (Vol. I p. 61)
«É esta a ultima furna ou caverna que vae marcada na
carta prehistorica pertencente á região do cabo de S. Vicente, comquanto fiquem
mais algumas sem indicação, o que só poderá supprir-se, se se chegar a tratar
do estudo especial das cavernas. Está sobre o flanco esquerdo da enseada
defendida pela fortaleza da Balieira (que tambem defende o flanco esquerdo da
enseada de Sagres) e a margem direita da ribeira, ou antes pequeno rio de
Benaçoitão. Parece ser uma das grandes cavernas da costa do sul. É larga a sua
entrada e accessivel a um batel. A abobada do seu magestoso atrio é um tanto
abatida. É mui visitada por caçadores de pombos bravos. Nada se sabe porém das
suas ramificações e dos seus mysterios. Pertence comtudo a uma região, fechada
por uma serie de pontos em que são frequentes os instrumentos de pedra polida,
taes como o cabo de S. Vicente, Catalão, Villa do Bispo, Sellanitos, Budens e
Areias.»
ESTAMPAS:
Em 1945, António de Barros Machado e Bernardino de Barros Machado publicam o seu Inventário das Cavernas Calcárias de Portugal.
Organizado por Distritos, Concelhos e Freguesias, na sua página 21, inventaria 6 cavidades no Concelho de Vila-do-Bispo: 1 na Freguesia de Budens; 4 na Freguesia de Sagres; 1 na Freguesia de Vila-do-Bispo.
De notar a referência às 4 cavernas (acima) referidas por Estacio da Veiga, em 1886, no volume I das suas Antiguidades Monumentaes do Algarve.
Segue-se a transcrição do texto:
Distrito de FARO, Concelho de Vila-do-Bispo (p. 21)
Freg. Budens:
(96) Gr., perto da povoação.
Freg. Sagres:
(97) Fojos da Ponta de Sagres, no extremo da Ponta de Sagres, à esquerda do posto semafórico, O [CORTESÃO, Jaime (1927) – Sagres. In Guia de Portugal. PROENÇA, vol. 2, p. 314].
(98) Furna do Beliche-Velho, na costa maritime, entre a fortaleza de Beliche e a ponta de Sagres [VEIGA, E. da (1886) – Antiguidades Monumentaes do Algarve - Tempos Prehistoricos, vol. I. Lisboa: Imprensa Nacional, p.61].
(99) Furna de João-Vaz, «sôbre o flanco esq. da enseada defendida pela Fortaleza da Balieira e a margem direita da ribeira de Benaçoitão» [VEIGA, E. da (1886) – Antiguidades Monumentaes do Algarve - Tempos Prehistoricos, vol. I. Lisboa: Imprensa Nacional, p.61].
Freg. Vila-do-Bispo:
? (100) Gr. dos Ouriçais, «junto à praia da Roiçada ou do Telheiro, 1 km a NO da ponta do cabo e outro a S do Leixão de S. Vicente sôbre a costa ocidental» [VEIGA, E. da (1886) – Antiguidades Monumentaes do Algarve - Tempos Prehistoricos, vol. I. Lisboa: Imprensa Nacional, p.60].
? (101) Cav. da Barriga, a NE e distante da ponta do Cabo de S. Vicente uns 5 km e uns 6 para O.SO de Vila-do-Bispo [PROENÇA, R. (1924) – Guia de Portugal, vol. 1, LXIV, Lisboa: Biblioteca Nacional, p.319] [VEIGA, E. da (1886) – Antiguidades Monumentaes do Algarve - Tempos Prehistoricos, vol. I. Lisboa: Imprensa Nacional, p.319].