A ‘História do Mês’
consiste numa iniciativa expositiva do Centro de Interpretação de Vila do Bispo
iniciada em janeiro de 2015 onde, mensalmente, se apresenta um objeto e um
associado discurso informativo. Além da divulgação, valorização e partilha de determinados
apontamentos e curiosidades da memória coletiva do território, pretende-se, com
esta iniciativa, provocar hábitos de visita ao nosso equipamento cultural.
Quem ainda não se deparou com um céu
escurecido por largas centenas de grandes aves planadoras, que, calmamente e
desenhando círculos, se elevam a grandes alturas?
Quem ainda não se deteve, por alguns minutos,
para contemplar este incrível espetáculo proporcionado pela Natureza, oferecido
por estas grandes aves de certa forma bizarras?
Na ‘História do Mês’ de outubro de 2017 fique
a conhecer um pouco melhor o Grifo, também conhecido por “abutre-fouveiro” (Gyps
fulvus), a maior e mais emblemática ave que, durante algumas semanas de outono, domina de forma incrível os céus do
concelho de Vila do Bispo.
Venha conhecer esta História, passe pelo Centro de Interpretação de Vila do Bispo e aproveite a oportunidade para visitar a exposição, patente até ao final do ano, intitulada "Era uma Vez em Vila do Bispo... uma viagem desde a Pré-história ao Mundo Romano".


Campeões dos céus de outono
os Grifos (Gyps fulvus) chegaram a Sagres!
Bibliografia de referencia:
texto e fotografia de Ricardo Soares (arqueólogo, CMVB)
Campeões dos céus de outono
os Grifos (Gyps fulvus) chegaram a Sagres!
Sagres, o
extremo sudoeste do continente europeu, constitui um dos mais importantes
pontos de passagem nas rotas migratórias de várias espécies de aves que
anualmente, no final do verão, abandonam a Europa a caminho das terras quentes
de África. Estas aves, sobretudo juvenis e menos experientes, seguem a
orientação natural da costa atlântica da Península, até ao Cabo de São Vicente,
em Sagres, local onde se reúnem por algumas semanas e de onde prosseguem até à
região de Gibraltar, o ponto mais próximo de África e mais propício para a
grande travessia do Estreito.
Durante
este período, conhecido como a grande migração outonal, a região de Sagres
reúne uma incontável quantidade e variedade de espécies de aves, provenientes
de distintos habitats, propiciando um incrível fenómeno, único em Portugal.
Esta rara concentração de aves permite a fácil observação de diversas rapinas e
planadoras de grande porte, que exuberantemente se destacam nos céus,
nomeadamente Cegonhas-pretas, Britangos (Abutres-do-Egito) e imensos bandos de
Grifos; e outras, mais pequenas e discretas, denominadas de passeriformes, igualmente
com elevado interesse e beleza. Também em áreas estuarinas, como os pauis da
Boca do Rio e do Martinhal, nas arribas e no mar, são observáveis bastantes espécies
de aves pelágicas, ou seja, marinhas.
Em 2010,
consciente desta realidade, a Câmara Municipal de Vila do Bispo convida a SPEA (Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves) e a Almargem (Associação de Defesa do
Património Cultural e Ambiental do Algarve) para, conjuntamente, colaborarem no
sentido da criação de condições de acolhimento aos observadores desta grande
migração outonal, por via da organização de um evento pioneiro no nosso país,
ainda hoje único a nível nacional, tanto no seu perfil, como no tema explorado.
Desde
então, ano após ano, este evento tem vindo a consolidar-se como um diferenciado
‘cartão-de-visita’ do território concelhio de Vila do Bispo. Passados 8 anos
desde a 1.ª edição deste projeto, a península de Sagres encontra-se plenamente referenciada
como spot de interesse internacional
nos roteiros de observação de aves. Hoje designado por Festival de Observação de Aves & Atividades de Natureza,
assume-se como um evento que vai muito além do tema “aves”, apresentando o
território vilabispense como um todo, nos seus diversificados e diferenciadores
aspectos, quer de ordem natural, quer de âmbito cultural.
Quanto às
“aves”, além de mote para a reunião, têm cumprido o competente papel de
autênticos anfitriões para quem visita Sagres nos primeiros dias de outono.
Na
perspetiva local, para os habitantes do Concelho de Vila do Bispo, o Grifo é a
espécie mais emblemática que domina os nossos céus durante algumas semanas da
estação outonal. Quem ainda não se deparou com um céu escurecido por largas
centenas de grandes aves planadoras, que, calmamente e desenhando círculos, se
elevam a grandes alturas? Quem ainda não se deteve, por alguns minutos, para
contemplar este incrível espetáculo proporcionado pela Natureza, oferecido por
estas grandes aves de certa forma bizarras?
O Grifo,
também conhecido por “abutre-fouveiro” e tendo por nome científico Gyps fulvus (Linnaeus 1758), é um abutre
que ocorre nas escarpas de montanhas do sul da Europa, do Sudoeste Asiático e
de África. É normalmente gregário e estabelece colónias que podem reunir 200
casais. Em Portugal nidificam algumas centenas de casais de grifos, sendo a sua
distribuição bastante assimétrica. Ocupando sobretudo as zonas interiores e
fronteiriças, as principais colónias situam-se no nordeste transmontano, que
alberga mais de metade da população portuguesa, mas também nas áreas protegidas
do Parque Natural do Douro Internacional, do Parque Natural do Tejo
Internacional, nas Portas de Ródão, surgindo ainda alguns grupos mais a sul, na
Serra de São Mamede.
Durante a
grande migração outonal e conforme as condições climáticas e o prolongamento do
bom tempo estival, alguns membros destas colónias do sul da Europa, sobretudo
os juvenis, rumam até Sagres como se de uma peregrina viagem iniciática se
tratasse. Atualmente, entre meados de outubro e meados de novembro, reservam
cerca de duas semanas para visitar este nosso grande Cabo Sagrado, aproveitando
as correntes térmicas ascendentes para se elevar nos céus e, com a força do
vento norte, planarem até à costa norte de África, voando grandes distâncias
quase sem bater as suas enormes asas.
Muito
grande, maior que as maiores águias, os Grifos chegam a medir até 1 metro de comprimento
e 2,7 metros de envergadura de asas, pesando de 6 a 12 kg. Enquanto necrófagos,
alimenta-se quase exclusivamente de carniça, passando longos períodos do seu
dia-a-dia a pairar no céu, em círculos, à procura de cadáveres. Porém, cada vez
mais têm sido registados episódios de ataques de grifos a presas vivas,
especialmente animais jovens, debilitados ou doentes, designadamente rebanhos
de ovelhas.
Em voo tem
uma silhueta típica, com enormes asas, muito maiores que o corpo e com
extremidades dedilhadas (rémiges), cauda curta e arredondada, completamente
aberta. A parte superior e inferior do corpo apresenta uma cor castanha clara, com
as pontas das asas e a cauda pretas. O pescoço, bastante característico, é angulosamente
encolhido, apresentando um colar espesso de penas claras na base, sendo depois
coberto de pequenas penas brancas até à cabeça, com um aspecto lanoso. Tem
patas cinzentas bastante débeis, pois não as usa para agarrar as presas como as
águias. Sendo um accipitrídeo, o bico apresenta uma curvatura típica das
rapinas, sendo extremamente forte e preparado para a tarefa de descarnar e de
explorar as entranhas de carcaças de animais de qualquer porte.
Nidifica
em saliências ou fendas de elevadas escarpas rochosas, construindo um ninho de
gravetos e ervas. Com uma postura anual, entre janeiro e junho, põe um só ovo,
branco, que eclode ao fim de 48 a 54 dias. A cria demora entre 110 a 115 dias
até reunir condições para o primeiro voo. Os dois progenitores revezam-se na
incubação do ovo e, depois, na alimentação da sua cria única. Ao contrário de
outras aves, esta, se não receber a quantidade de alimento necessária, é
incapaz de atrasar o seu crescimento, morrendo de inanição.
Na
Península Ibérica o número de grifos tem vindo a crescer desde 1980, anos em
que se contavam apenas cerca de 1000 exemplares. No entanto, desde que as
normas da União Europeia proibiram o abandono de gado morto nos campos,
sobretudo a partir da crise das “vacas loucas”, o alimento para estes animais
diminuiu drasticamente, facto que tem vindo a contribuir para a diminuição da
sua população no resto da Europa.
Bibliografia de referencia:
Plano Sectorial da Rede Natura 2000. “Fauna,
aves, Gyps fulvus, Grifo”. Instituto
da Conservação da Natureza e da Biodiversidade.
texto e fotografia de Ricardo Soares (arqueólogo, CMVB)