José Mendes
Professor Catedrático da Universidade do Minho
O outro Algarve
A estrada que leva ao Farol de Sagres apresenta, ao
fim de cada tarde, um invulgar movimento. Após um soalheiro dia de verão, é ver
a romaria em direção à falésia que marca o fim do território europeu. São
novos, velhos, adultos e crianças, grande parte estrangeiros, com um agasalho
de reforço que indicia que sabem bem ao que vão. Naquele vento que dá ao lugar
uma atmosfera mítica, eis que o sol inicia o seu mergulho diário, afundando-se
no oceano para lá do horizonte, oferecendo aos entusiastas um inigualável pôr
do sol. A multidão aguarda em silêncio, extasiada, e quando por fim a enorme
bola de fogo se extingue e a luz subitamente baixa, agradece à natureza com uma
simbólica salva de palmas.
Este episódio, que tive o privilégio de viver no
final de semana, é bem o exemplo do potencial que "o outro Algarve"
tem para para ser conhecido e rentabilizado. Nada contra o sol e a praia, que
aliás é de excelência na região, mas vale a pena desfocar a atenção habitual
sobre a fruta madura e olhar mais alto na copa da árvore do turismo. Foi isso
que fez o município de Vila do Bispo, onde se situa Sagres. Olhou para os seus
ativos com olhos de ver e vem construindo uma estratégia de afirmação
alternativa, que complementa na perfeição as delícias que todos apreciamos no
Algarve. Com a vantagem de combater a sazonalidade.
Para quem, compreensivamente, se espanta com a famosa
onda gigante da Nazaré, é ver o espetáculo do mar a bater na rocha dura da falésia
de Sagres e a elevar-se bem lá acima dos cinquenta metros, num invernal rugido
da natureza digno de se apreciar. Ou, então, apetrechar-se de uns binóculos e
do equipamento fotográfico, seja ele o mero iphone ou a câmara de objetiva
ultralonga, e apresentar-se nos primeiros dias de outubro para participar num
evento de birdwatching que atrai turistas de natureza de tantos países,
ansiosos por observar os pelotões de pássaros que, em migração, retemperam
energias nas cercanias de Sagres. E que dizer da refrescante atmosfera de
liberdade que a comunidade do surf e do bodyboard empresta ao concelho e às
praias? Os principais átrios de areia, que dão entrada ao magnífico mar, são
sede de escolas que colocam miúdos e graúdos sobre pranchas, e estas sobre as
ondas, numa dança que é imagem de marca desta ponta de Portugal. Os mais
introspetivos podem sempre descer a falésia e caminhar ao longo da costa, pois
as extensas praias quase desertas ali estão para ser usufruídas. Por fim, a
gastronomia, que por estes dias eleva Vila do Bispo a capital dos percebes.
Este outro Algarve merece ser descoberto. Pode não
ser para as massas, mas é certamente um magnífico diamante por lapidar. Vila do
Bispo sabe disso e foi, justamente, considerado o Município do Ano Portugal 2015. Uma lição de como ser grande, sendo pequeno.